quarta-feira, 30 de maio de 2012

Exervício

A plenitude do fim
cravada no marfim
da existência aviltada
conduz a crença
da minha doença
descabida e degenerada:

do pessimismo funéreo
ao vazio etéreo
será que existo?
esta forma ambígua
que substitui a míngua
é onde insisto.

A busca impossível
do aquém-verossímil
torna-se insignificante
quando o desalento
forja o intento
outonando o instante

a maldição excedida
é a filia concedida
do medo flagelado.
Eis minha epopeia
predicada sem estreia
digna de um condenado.

domingo, 27 de maio de 2012

O Lamurio da Esperança

"Devem estar ainda em algum lugar as pobres coisas"
Konstantinos Kaváfis. O Sol da Tarde

Eu trago o passado em sufusão
Tentando existir des-integrado,
Porém, novamente sou tragado
Pela bestialidade desta invenção,

A endocardite e seu intento
Atestando o asco espectral,
Todo suspense é residual;
Eis a macropia do lamento.

Entre a tormenta e o túmulo,
A indiferença atesta o acúmulo
De tantas sombras nesta alcova,

Em tudo o que foi prometido,
Certamente poderíamos ter sido,
Contudo, a rachadura se renova.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

O Sufíbulo da Alma

"(...) and with a pain
No hell shall make me fear again"
        Edgar Allan Poe

A dor do regresso
é o pior dos tormentos
que encontro nos momentos
da espera em recesso,

quando a anemia dialoga
com o pretenso fracasso,
o cenário é esparso
e vai além da sinagoga,

não há exorcismo para mim,
não sou -mais- réu primário
da catástrofe ao obituário
o meu fim é sempre assim,

nunca aposte sua cabeça
com o diabo, dizia
o apostador em primazia
espero que não aconteça

a colheita das almas errantes,
[esta foi a minha aposta]
aquém da vertigem exposta
encontram-se as vozes torturantes

deste inferno metafísico. Entretanto
o vazio ainda prospera
lá onde o isolamento dilacera
qualquer possibilidade de espanto.

domingo, 20 de maio de 2012

Insustentável

"A nostalgia pior é a do instante presente"
Paulo Henriques Britto


A ilusão e o bem estar
são artífices da mesma história,
designam a própria escória
que Merodaque se pôs a cortejar,

eu espero, sem nenhuma glória,
e esperar, você sabe, é sangrar,
não há nada mais familiar
que esta monstruosidade simplória

e sem aspiração, do aborto
da autonomia ao verso torto
a saída segue esquecida

por entre diásporas e saques,
-vernáculos despidos de seus fraques-
a razão é a minha ferida.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Quarto 606







"Negotium perambulans in tenebris..."
 Salmos 91:6

Tal como um ritual mesopotâmico
de adoração a seres esquecidos,
encontro-me entre os fenecidos
perante este velório oceânico

onde, do preâmbulo ao bálsamo
o fascínio molesta a consignação,
Alhazred aquém da calefação
designa o constructo de sésamo

deste poeta em vias de derrota,
pois cada palavra não exorta
o arrefecido gesto mortuário:

ceder ao negrume que corta
o mesmo endereço, a mesma porta,
a mesma existência sem latrinário.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

O Espelho

A exumação que não acontece.
O vazio que não se preenche.
Está é a prisão sem feixe
Que minha inaptidão apetece,

Pois, sou a alcova da noite,
Sem melodia e sem afeto,
Estou nulo em mim, decerto
Servirei perfeitamente ao açoite;

Que minhas carnes sejam ingeridas,
Que sobrem apenas as feridas,
Tal como um relicário de fracassos.

Eu coaduno o vazio presencial,
Sem liturgia, sem Belial,
Eu. Apenas eu e meus percalços.